sábado, 25 de agosto de 2007

Soneto da Solidão


Eis que meu pulso quer brigar com a intrepidez.
Onde fora repousar a tolerância de minha calma?
Aceito que esteja intrínseco no sangue, a altivez
Dessa bruta inquietude, que fere e sangra a alma.

Mas se não puder acertar a angústia, choro?
Prefiro calar, silêncio absoluto soa por ali.
Palavras são consolo, no retumbar do coro
E eu, vácuo dinâmico confuso, vôo daqui.

Minha lástima é profícua e deveras intensa,
Não tenho barcos, ou homens lançados ao mar,
Sou: água e sal, sol e ilha, ou solidão propensa.

Esse "canto-silêncio" afogado e impelido ao ar,
Fez-me rever esse ermo, com enorme indiferença
O que me falta? O sentido que chamam de AMAR?
By Stella Schiavo

Vazia, e sem perdão


Teu silêncio me implica questionar a falta de afecto que tens mantido...

Sei que se recordas com carinho de todas as trapalhadas e momentos de felicidade que tivemos...

Mas o fato de não mais me procurares, está me confundindo actualmente...

Minha saudade para contigo é retumbante em meus pensamentos...

Relevante esse egoísmo de amizade...

Talvez fiz diferença em seus dias, ou não...

Hoje estou aqui para dizer o quanto preencheu em minhas falhas...

Não quero trazer a memória nossas brigas ou trapaças, mas nossa fidelidade como amigas...

Onde está você?

Me diga o que passou, quem sabe não sofismo suas buscas?

Ou aproveito teu momento de conflito para dizer o quanto és amada por mim...

Essa saudade sem fim me machuca deveras...

Gosto do teu sorriso espontâneo, suas lágrimas sangrentas, sua voz vazia de solidão...

Por onde vaga minha ausência em teu peito?

Posso voltar a nossa pré-adolescência neste instante, e saudar gargalhadas e destreza...

Amo-te amiga minha!

Fique em paz em minha consciência inquieta!

Abraços eternos...

domingo, 19 de agosto de 2007

Felicidade - André Díspore Cancian


Aqui

Nesta celestial vacuidade

Onde tudo é provisório

Nasce acabado e corroído

Cada qual à sua maneira

Contorce-se e se reinventa

E morre sem ter vivido


Grande ou pequena

Cada qual abraça sua quimera

Nessa dança ridícula da vida

Onde se chora para então sangrar

[todos os dias


Quando a infância se despede

Deixando as lembranças

Levando uma amplitude de ser

Delas retiramos descrições

As mais belas invenções

Nutrindo toda beleza

Profusão de ideais

O dobro de tudo

Pintado em todas cores

Num quadro num quarto da memória

[dos plágios


Ao meu lado, vida real

Algumas variedades

De perspectivas delirantes

Três sentidos da vida:

Tomar banho, beber café ou dormir

Enfado...


O problema não é a cura

– dizem –

Nem é a doença

O problema escapa pelas mãos:

As coisas pequenas demais

Onde dizem estar a felicidade

– serão aleijados voluntários ou

incapazes do que é grande? –

Seria isto, então, o problema:

Nascemos sem os óculos – da alma?

Nascemos sem os nervos – dos heróis?


Quem cresceu para aprender

A ver com o coração

Quem esqueceu para voltar

A ver com os olhos

Conhece as minas da fascinação

Os espelhos que ofuscam a razão

Os espelhos que refletem a ilusão

O espaço vazio entre tudo – o vão

A repulsão entre tudo – a contradição

Será que ela se abraça

Ou ignora a explicação?

Que culpa teria o erro?

Prometeu alguma verdade?

Que prometeu um sentido?

Que trocaria a escolha

Pelo sorriso plastificado

Da felicidade obrigatória?


– se é que vale a pena –

Vai e mira qualquer coisa

Além dela mesma

Pois como é triste viver

Em meio à matemática

Sem nenhum enigma

[sem resposta

Sem nenhuma paisagem

Lançando véus e enigmas

A cobrir este lamaçal de vida

Toda solução indica o nada

– o fim prematuro da jornada –

Que dá numa encruzilhada

Onde há um milhar de duas placas:

Seja bem-vindo! Boa viagem!

(aqui é o começo)

(aqui é a chegada)

Somente resta a disposição

[indisposta

Em explicar o porquê de uma rota

O porquê de um passo, do movimento

[dessa música

De somente uma nota


Digo isso porque, nesta cadeia

Encontrei a minha resposta

(de longe, era tão bela...)

Não era igual a todas:

(um meio) – Era o derradeiro

Âmago do absurdo

O cerne a contradição

As vísceras dos átomos

Entoando uma melodia pródiga

Tão amarga, verdadeira

Que me fiz prisioneiro

(seria um eremita

se houvesse um caminho

pelo qual regressar)

Forjei minhas correntes

E espero: um há de ceder

De se decompor primeiro


Em meus sonhos

O detector de metais acusa:

Uma arma apontada à cabeça

(como invejo esta máquina...)

Este é o único sonho

Em que sei ser feliz:

Sentindo a liberdade

Rasgar as couraças do peito

As mãos, os pés – obedecem!

As cores sonhadas, renascem

De uma memória abandonada

Por um segundo, um vislumbre:

Tenho todas as escolhas

Mas por que nenhuma?

Sonhos são para um só dia


Nunca chega a hora

Mudo, nada muda

Volto, nada muda

Avanço, nada muda

Desisto, e me empurram


Mas não aprendi a dançar

Não aprendi a caminhar

Não aprendi as certezas

Dos passos firmes

(sabe lá para onde)

(sabe lá para quê)

Cada movimento

Em tudo que tem valor

Só me gera a sensação

De que nunca saí do lugar

De que me comportei

Devidamente: como um aleijado

Nunca chega, hora nenhuma!


Não que, no fundo, seja diferente

Não que, no íntimo, seja especial

Como exemplar dos qualquer-um

Sou também uma pequena merda

E será minha felicidade evaporar

[todo o esgoto das veias

Tudo aquilo que se ensina a calar


Vazio

Procuraria pelas palavras

De uma despedida tão altiva

Que a arrogância das máquinas

[se curvaria

E me daria boas-vindas

E me abraçaria o rosto

[decomposto

E o germe estéril

Que criou o homem

E uma realidade insólita

[nele

E uma inquietude estúpida

[em nós

De não querer não desejar

[não sofrer

Permanentemente

Suicida potencial

Sufocando a cada respiro

[frustrado

Somente na morte

– entrementes –

Entre mentiras e entorpecentes


(mas não é preciso escolher o fim

podemos optar pelo medo cansado

baixar a cabeça, suspirar, esperar:

– acorrentados ou caminhando –

no fim, não temos escolha

sonhamos no mesmo lugar...)


Seja bem-vindo!

(aqui é o começo)

Abrace sua quimera!

Boa viagem!

(aqui é a chegada)

Hora nenhuma!

ANÁLISE - Fernando Pessoa


Tão abstrata é a idéia do teu ser

Que me vem de te olhar, que, ao entreter

Os meus olhos nos teus, perco-os de vista,

E nada fica em meu olhar, e dista

Teu corpo do meu ver tão longemente,

E a idéia do teu ser fica tão rente

Ao meu pensar olhar-te, e ao saber-me

Sabendo que tu és, que, só por ter-me

Consciente de ti, nem a mim sinto.

E assim, neste ignorar-me a ver-te, minto

A ilusão da sensação, e sonho,

Não te vendo, nem vendo, nem sabendo

Que te vejo, ou sequer que sou, risonho

Do interior crepúsculo tristonho

Em que sinto que sonho o que me sinto sendo.

12-1911

Ter ou não ter namorado, eis a questão - Artur da Távola


Quem não tem namorado é alguém que tirou férias remuneradas de si mesmo. Namorado é a mais difícil das conquistas. Difícil porque namorado de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia. Paquera, gabira, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão é fácil. Mas namorado mesmo é muito difícil.
Namorado não precisa ser o mais bonito, mas ser aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio, e quase desmaia pedindo proteção. A proteção dele não precisa ser parruda ou bandoleira: basta um olhar de compreensão ou mesmo de aflição.
Quem não tem namorado não é quem não tem amor: é quem não sabe o gosto de namorar. Se você tem três pretendentes, dois paqueras, um envolvimento, dois amantes e um esposo; mesmo assim pode não ter nenhum namorado. Não tem namorado quem não sabe o gosto da chuva, cinema, sessão das duas, medo do pai, sanduíche da padaria ou drible no trabalho.
Não tem namorado quem transa sem carinho, quem se acaricia sem vontade de virar lagartixa e quem ama sem alegria.
Não tem namorado quem faz pactos de amor apenas com a infelicidade. Namorar é fazer pactos com a felicidade, ainda que rápida, escondida, fugidia ou impossível de curar.
Não tem namorado quem não sabe dar o valor de mãos dadas, de carinho escondido na hora que passa o filme, da flor catada no muro e entregue de repente, de poesia de Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes ou Chico Buarque, lida bem devagar, de gargalhada quando fala junto ou descobre a meia rasgada, de ânsia enorme de viajar junto para a Escócia, ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo, tapete mágico ou foguete interplanetário.
Não tem namorado quem não gosta de dormir, fazer sesta abraçado, fazer compra junto. Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele; abobalhados de alegria pela lucidez do amor.
Não tem namorado quem não redescobre a criança e a do amado e vai com ela a parques, fliperamas, beira d'água, show do Milton Nascimento, bosques enluarados, ruas de sonhos ou musical da Metro.
Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos, quem não se chateia com o fato de seu bem ser paquerado. Não tem namorado quem ama sem gostar; quem gosta sem curtir quem curte sem aprofundar. Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim de semana, na madrugada ou meio-dia do dia de sol em plena praia cheia de rivais.
Não tem namorado quem ama sem se dedicar, quem namora sem brincar, quem vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar o outro ir junto com ele.
Não tem namorado que confunde solidão com ficar sozinho e em paz. Não tem namorado quem não fala sozinho, não ri de si mesmo e quem tem medo de ser afetivo.
Se você não tem namorado porque não descobriu que o amor é alegre e você vive pesando 200Kg de grilos e de medos. Ponha a saia mais leve, aquela de chita, e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras e escove a alma com leves fricções de esperança. De alma escovada e coração estouvado, saia do quintal de si mesma e descubra o próprio jardim.
Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem passe debaixo de sua janela. Ponha intenção de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fada. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteio.
Se você não tem namorado é porque não enlouqueceu aquele pouquinho necessário para fazer a vida parar e, de repente, parecer que faz sentido.

Estou cansado - Álvaro de Campos


Estou cansado, é claro,
Porque, a certa altura, a gente tem que estar cansado.
De que estou cansado, não sei:
De nada me serviria sabê-lo,
Pois o cansaço fica na mesma.
A ferida dói como dói
E não em função da causa que a produziu.
Sim, estou cansado,
E um pouco sorridente
De o cansaço ser só isto —
Uma vontade de sono no corpo,
Um desejo de não pensar na alma,
E por cima de tudo uma transparência lúcida
Do entendimento retrospectivo...
E a luxúria única de não ter já esperanças?
Sou inteligente; eis tudo.
Tenho visto muito e entendido muito o que tenho visto,
E há um certo prazer até no cansaço que isto nos dá,
Que afinal a cabeça sempre serve para qualquer coisa.

Eu Amo Tudo O Que Foi - Fernando Pessoa


EU AMO TUDO o que foi,
Tudo o que já não é,
A dor que já me não dói,
A antiga e errônea fé,
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Foto de Chema Madoz---edição de Stella Schiavo


"Se subisse ao reflexo de meus obros, deixar-lhe-ia cair em cacos de vidros"
(Frase inspirada pela foto, Stella Schiavo)

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Motivos - Chico Poeta

Sonha, menina, que o


tempo é escasso,


remenda os pedaços


das decepções. Sonha e vive


não há tempo pra tudo


pra erro há desculpas


de muitos perdões.


Há espaço pra sonhos


de pouco sonhar,


há verbos presentes


te basta usar.


O que tu pensares


procura agir,


te enfrenta, menina,


não vale fugir.
Se hoje fizeres


o que sempre quiseste


não tens que pensar no


abstrato feliz.
Para que mais tarde


somando viver


não te arrependas


das coisas que deixaste


de fazer;


sonha, menina.

Entrepostos: o ABISMO e EU!


Deste modo não pode haver jeito!

Infelicidade, descaso, despeito...

Ora, não vá dizer que a culpa além

de maldita, não foi sua!

Por sua vez, a princesinha e seu

castelo fora ao chão. Caindo na subida

e ardendo ao fogo...

Carregando consigo um brilho apagado, um sorriso frustrado, e um ego aleijado!

Oh porquês de felinos-fantoches-mortos em mim!

Eita que meu "EU" se levantou e derramou cólera por sobre os demais!

É sangue quente que passa dentro de meu cerne molhado!

Vem um asco que domina meu veneno destilado...

Eh ignorância!

Eh egoísmo que cospe a alma no lixo!
By Stella Schiavo